segunda-feira, 23 de março de 2009

O deficiente e a família

O DEFICIENTE E A FAMÍLIA
Psicóloga Dra. Cleide Grillo
Atualmente dados da Organização Mundial de Saúde, informam que cerca de 10% da população mundial é portadora de algum tipo de deficiência, em países em desenvolvimento, esses números podem chegar a 15%. Apesar de um número significativo, a maioria das pessoas não tem conhecimento sobre o assunto. Percebe-se como são exaustivas as tentativas que fazem as crianças excepcionais para serem aceitas na sociedade, na escola e principalmente em seu meio familiar.
FamíliaEm termos gerais, pode-se descrever a família como um grupo de pessoas que se inter-relacionam e se influenciam mutuamente, por forças intra e inter-psiquicas, formando assim um campo dinâmico no qual se dá seu desenvolvimento. O ser humano tem necessidade imprescindível dela enquanto organismo em cujo seu seio nasce cresce, evolui, amadurece e morre. Toda criança requer um pai ou mãe, para com eles poder elaborar suas punsões e transforma-las em sublimações.Enrique Pichon Rivierre (1986) define a família como uma estrutura social básica, configurada pelo entrejogo de papeis diferenciados (pai, mãe, filho), entrejogo que constitui o modelo natural de integração de grupo.A influencia da família tem um papel relevante nas possibilidades do desenvolvimento, partindo-se da idéia de que as bases da personalidade e da saúde como também a disposição para a doença, se instalam através das séries complementares integradas pelos fatores constitucionais pela vida intra-uterina, pelo trauma do nascimento e pela vida infantil.
Expectativas quanto ao nascimento e o diagnósticoToda mãe cria expectativas quanto ao nascimento de um filho após a experiência da gravidez e do parto, deveria vir à compensação que faria dela uma mãe feliz. A ausência dessa compensação produz efeitos, levando-a a fantasias que orientam a criança para o seu destino.Mesmo nos casos em que entra em jogo um fator orgânico, a criança não tem que fazer face apenas a uma dificuldade inata, mas ainda à maneira como a mãe utiliza esse defeito num mundo fantasioso que acaba por ser comum às duas.Os pais questionarão indefinidamente o diagnóstico, geralmente é a mãe quem irá travar uma batalha longa cujo alvo é a saúde de seu filho deficiente.Se o pai está abatido, resignado ou inconsciente do verdadeiro drama que se desenrola a mãe está a maior parte das vezes lúcida.Geradora de vida ela é de tal modo sensível a qualquer atentado à vida que sai dela, que também pode sentir-se senhora da morte quanto ao ser que trouxe ao mundo, tornando impossível para ela qualquer projeção humana.
A relação de amor mãe-filho terá sempre, neste caso, um ressaibo de morte, de morte negada, disfarçada a maior parte das vezes em amor sublime, algumas vezes em indiferença patológica, outras vezes em recusa consciente, mas as idéias de homicídio existem, mesmo que nem todas as mães possam tomar consciência disso.O reconhecimento desse fato está por outro lado ligado, muito freqüentemente a um desejo de suicídio o que torna evidente que se trata de uma situação realizada de maneira exemplar, em que mãe e filho não são senão um. Toda depreciação da criança é sentida pela mãe como depreciação de si própria. Toda condenação do filho é uma sentença de morte para ela. S ela decide viver, será preciso que viva contra o corpo médico, a maior parte das vezes com a cumplicidade silenciosa do marido, impotente num drama que nunca lhe dirá respeito com a mesma intensidade.A mãe vai, portanto viver contra os médicos, mas procurando seu apoio; vai a busca de uma verdade que na realidade não quer saber, ao que diz respeito ao filho que é na realidade o que diz respeito a ela.Ela deseja inconscientemente que sua pergunta nunca receba resposta, para que possa continuar a faze-la, porém precisa de força para continuar, e é isso que ela vem pedir. Precisa de uma testemunha que sinta que por trás da fachada de tranqüilidade, ela já não agüenta mais.
O nascimento de um filho é, antes de tudo a recompensa ou repetição de sua própria infância, o nascimento de um filho vai ocupar um lugar entre os sonhos perdidos, um sonho encarregado de preencher o que ficou vazio no seu próprio passado, uma imagem fantasmática que se sobrepõe à pessoa “real” do filho.Um filho de sonho que tem por missão restabelecer reparar o que na história da mãe foi julgado deficiente, sentido como falta, ou de prolongar aquilo a que ela teve que renunciar.Quando um filho carregado com todos os sonhos perdidos da mãe nasce doente, a irrupção na realidade de uma imagem de corpo enfermo produz um choque na mãe; no momento em que no plano fantasmático o vazio era preenchido por um filho imaginário, eis que aparece o ser real que, pela sua enfermidade, vai não só renovar os traumatismos e as insatisfações anteriores como também impedir posteriormente, no plano simbólico, a resolução para a mãe de seu próprio problema de castração.Porque esta verdadeira chegada á feminilidade terá inevitavelmente de passar pela renúncia à criança fetiche, que é senão o filho imaginário do Édipo.Em compensação verifica-se na realidade uma certa situação fantasmática, este filho lhe é dado como um objeto para cuidar fora da influência do marido e é muitas vezes em referência ao seu próprio pai que ela encontrará a for; cá para educa-lo.Toda mulher, diante das referências de identificação que estão ausentes no filho doente, vai viver a sua angústia. Esta angústia que não podem partilhar com os outros é muito difícil de suportar, portanto há um momento na história do filho doente em que o problema da mãe se coloca com maior intensidade que o dele.Para uma mulher que manteve más relações com a mãe, o nascimento de um filho excepcional implica o risco de despertar os conflitos neuróticos e compensados pelo casamento, há angústia e por vezes reações fóbicas.Para uma mulher muito ligada ao pai, o filho vai encontrar um lugar definido na família. Muitas vezes será o preferido, aquele que na fantasia materna, os outros irmãos terão que servir até a morte.Para uma mãe dita normal, o nascimento desse filho não pode deixar de ter incidência sobre ela, tais mães ficam marcadas pela provação e chegam a assumir um aspecto esquizóide à força de se comportarem, também em resposta ao filho de uma maneira atônica.
As famílias que possuem membros com deficiência sentem necessidade de se organizar, devido a fortes mecanismos cristalizados ao longo do percurso destas relações vividas no seio familiar. Essas famílias necessitam de atendimento psicológico para fortalecer e se conscientizar de que há formas de melhorar a qualidade de sua vida e de seus filhos, repensarem posturas, modificarem referências e transformar relacionamentos. Fonte:MANNONI, Maud. Ä criança retardada e a mãe.




-->